pode não parecer (ou parece), mas eu sou uma pessoa desequilibrada. não tenho nenhuma condição psicológica séria (afirmação que minha terapeuta faz a cada 15 dias quando pergunto “qual é o meu problema”), mas me desorganizo mentalmente muito fácil.
a dúvida, na alegria e na tristeza, me coloca em estado de suspensão. é diferente de euforia, de alegria ou de tristeza profunda. a dúvida me tira do corpo.
por dúvida compreendo qualquer situação — na esfera pessoal ou financeira, sei lá — que não dependa da minha intervenção controle e isso acaba comigo. 
é como se eu deixasse de ser uma pessoa e me transformasse em um vulto que realiza as tarefas que precisa realizar, mas não consegue, de fato, estar presente na vida. estou ali, mas não estou.
por essa razão, quando tô em estado de sangria desatada, desisto de qualquer atividade que precise de muita dedicação e atenção. planejar todas as ideias de aula para um trimestre inteiro tem essa vantagem: já tenho a ideia, só preciso executar. se precisasse realmente entrar de corpo nisso, não conseguiria, ou sofreria muito.
mais do que ser uma pessoa angustiada, sinto que me coloco em situação de angústia o tempo inteiro.
não é mais confortável você viver em estado permanente de melancolia e alerta, só para o caso de você não ser pega de surpresa tendo uma vida leve e alegre? (a resposta é não)
paranoias à parte, quando estou nesse transe gosto de retomar poemas e essa semana me peguei lendo todos os poemas, do paul auster, de novo (para surpresa de zero pessoas). porque sim. porque é na palavra que repouso, é na palavra que consigo respirar e voltar a quem eu sou por alguns minutos e descansar meu corpo comigo mesma, antes da mente sair galopando pelos cenários imaginários, o futuro próximo ou distante em que tudo já deu errado e a vida segue seu curso normal.
na espécie de ensaio filosófico sobre linguagem intitulada white spaces (espaços em branco), auster diz (entre tantas outras coisas que eu destacaria aqui se fosse possível):
In the realm of the naked eye nothing happens that does not have its beginning and its end. And yet nowhere can we find the place or moment at which we can say, beyond a shadow of a doubt, that this is where it begins, or this is where it ends. For some of us, it has begun before the beginning, and for other of us it will go on happening after the end. Where to find it? Don’t look. Either it is here or it is not here. And whoever tries to find refuge in any one place, in any one moment, will never be where he thinks he is. In other words, say your good-byes. It is never too late. It is always too late.
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No reino do olho nu nada acontece que não tenha seu começo e seu fim. E no entanto em lugar nenhum podemos encontrar o lugar ou o momento em que podemos dizer, sem sombra de dúvida, que é aqui que começa, ou é aqui que acaba. Para alguns de nós, começou antes do começo, e para outros de nós vai continuar acontecendo depois do fim. Onde encontrar? Não procure. Ou está ou não está ali. E quem quer que tente encontrar refúgio naquele único lugar, naquele único momento, jamais estará onde acha que está. Em outras palavras, diga seu adeus. Nunca é tarde demais. Sempre é tarde demais.
Paul Auster, tradução de Caetano Galindo
nessas de encontrar o ticket de retorno a mim em poemas, peguei louise glück para releitura. embora com poemas mais longos, que não é muito a minha pegada, ela também nos oferta boas descidas ao centro do ser, a exemplo dessa estrofe no poema landscape (paisagem):
All your life, you wait for the propitious time. Then the propitious time reveals itself as action taken.
A vida inteira você espera pela hora propícia.
Então a hora propícia
se revela como ação realizada. 
(tradução de heloísa jahn)a hora propícia como ação realizada — isso não é a coisa mais…exata que você já leu na vida? nessa fase de descolamento da percepção, ler essa estrofe me confronta: o momento propício, esse que pretendo construir/encontrar, não vai chegar. o momento propício depende da ação e a ação, sabemos, é movimento. então pega esse trem de volta ao que quer que seja de real, ao que quer que seja de realizável. (conversas dentro da minha cabeça)
obrigações de fincar os pés no chão e a necessidade de me apagar até o ponto de não existir, what a life.
me despeço com as palavras do auster e anseio por voltar melhor na semana seguinte.
I dedicate these words to the impossibility of finding a word equal to the silence inside me.
Dedico estas palavras à impossibilidade de achar uma palavra igual ao silêncio dentro de mim.
(tradução caetano galindo)
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